O melhor ano da Udinese de Antonio Di Natale

Talvez o futebol italiano seja o que melhor conserva as lealdades entre clubes e lendas. Exemplos são fartos, como as parcerias entre Roma e Francesco Totti, Milan e Paolo Maldini ou Juventus e Alessandro Del Piero não deixam mentir. E essa não é uma situação que se verifica apenas nas maiores forças do Calcio. Uma das provas responde pelo nome de Antonio Di Natale, lenda da Udinese e que, em 12 temporadas, viveu alguns dos melhores dias dos friulanos.


Foto: Desconhecido

Artilheiro, capitão e referência


Ao contrário do que aconteceu com outros jogadores lendários, Di Natale não começou sua carreira em Udine; o uniforme alvinegro não foi seu primeiro e único — mas seria o mais marcante. O goleador foi revelado no Empoli. Depois de empréstimos a Iperzola, Varese e Viareggio, firmou-se e começou a construir uma reputação como um dos melhores atacantes do país. A primeira temporada completa pelos Azzurri aconteceu em 1999/00. Foi a primeira de cinco.

Di Natale já tinha até estreado pela Seleção Italiana quando chegou ao estádio Friuli (atualmente conhecido como Dacia Arena, após a negociação dos naming rights). Ainda assim, nem o próprio devia imaginar a história que viria a ser construída. Já em sua primeira temporada no clube, viveu um ano especial, com a Udinese terminando o Campeonato Italiano na quarta colocação, atrás apenas de Juventus, Milan e Internazionale. Era a campanha de 2004/05.

Foto: Claudio Villa/Getty Images
Durante as temporadas que se seguiram, a equipe se manteria fazendo campanhas regulares, destacando-se outro quarto lugar e dois sétimos. Di Natale sempre registrando mais de 10 gols. 

O curioso é que depois de 2009/10, ano da pior classificação do clube naquele período (15º), o goleador finalmente passou a mostrar seu melhor futebol (é bem verdade, que foi o início de sua trajetória como centroavante, deixando a ponta esquerda em que atuava quando tinha em Fabio Quagliarella a referência). Sua ascensão foi tardia: na referida campanha, já tinha 32 anos. Aliás, desde 2007, já era o capitão da esquadra.

Convocado para a Copa do Mundo de 2010, fez parte do fracasso italiano, mas foi um dos poucos que escapou às críticas, tendo marcado um gol na única partida em que foi titular. Era um jogador extremamente decisivo, talentoso e com uma propensão especial para marcar golaços. Antes, ficou perto de firmar com a Roma, mas estava mesmo destinado a ser idolatrado pelos friulanos. 

Êxito em meio ao desmanche


Então, desenhou-se a temporada 2011/12. E ela não podia suscitar mais dúvidas. O clube acabara de negociar Alexis Sánchez com o Barcelona, Gokhan Inler com o Napoli, Cristian Zapata com o Villarreal e Simone Pepe com a Juventus. Encheu os cofres, mas perdeu jogadores muito importantes. 

Contra o desmanche, a Udinese trouxe o zagueiro brasileiro Danilo, o meio-campista argentino Roberto Pereyra e o romeno Gabriel Torje (outrora tido com o Messi romeno). Foi o caminho natural para um time que não figura no rol dos maiores do país e havia terminado o ano anterior em quarto lugar. Em que pesem tais problemas, o comandante de então, Francesco Guidolin, soube remontar seu time. 

Foto: imagephotoagency.it
Com o capitão on fire mais uma vez a equipe resistiu e conseguiu ser ainda melhor. Di Natale seguiu regulando. Depois dos 29 tentos de 2009/10, registrou 28 no ano seguinte. Em 2011/12, somadas todas as competições, foram outros 29.

Mesmo disputando a Liga Europa, ou seja, precisando recorrer mais ao seu elenco, o time alvinegro fez um ano memorável, terminando o Calcio na terceira posição. 

Não era difícil escalar aquele time, que via de regra ia a campo com Handanovic; Basta, Danilo, Benatia, Domizzi, Armero; Pinzi, Isla (Pazienza), Asamoah; Di Natale e Floro Flores (Fabbrini). 

Aquele time funcionou muito bem. Juntos, Armero e Basta fizeram 16 assistências. Eram alas de muita força ofensiva. O trio de meio-campistas também tinha enorme vitalidade, sendo hábil indo à frente e recompondo. No ataque, Floro Flores aceitou tranquilamente o posto de coadjuvante da estrela da companhia, Di Natale (apenas Edinson Cavani e Zlatan Ibrahimovic foram às redes mais vezes que o capitão friulano). E, lá atrás, o trio de zagueiro e o goleiro Handanovic firmaram um sólido pacto anti-gols — concedendo apenas 35 em 38 rodadas. 

Início histórico


No início da temporada, não foram só as negociações que trouxeram pessimismo. Classificado à disputa da última fase eliminatória anterior aos grupos da Liga dos Campeões da Europa, a Udinese teve pela frente a força do Arsenal, que teve Robin van Persie e Theo Walcott em grande. Os italianos perderam e desceram à Liga Europa. O sorteio colocou a equipe em um grupo parelho, com Rennes, Celtic e Atlético de Madrid. 

Em que pese tal situação, logo na estreia do Campeonato Italiano ficou claro que a equipe estava destinada a viver grandes dias. Enfrentando o poder da Juventus, segurou um empate sem gols. Os friulanos permaneceram invictos (4V e 4E) até a nona rodada, quando enfim perderam, para o Napoli. Entre a 10ª e a 17ª rodadas, a Udinese viveu outra sequência muito positiva. Perdeu apenas na 12ª para o Parma. E não foi só isso.

Os alvinegros passaram imunes à dura sequência enfrentada a partir da 13ª partida. Venceram dois confrontos diretos contra Roma e Internazionale (este fora de casa), deixaram pelo caminho o Chievo e, na capital italiana, arrancaram um empate com a Lazio. O primeiro turno da equipe foi excelente, computando apenas três derrotas. Mas o fôlego acabou.

Dificuldades e ressurreição ao final


No returno, a derrota para a Juve inaugurou um período difícil. E a pecha de cavalo paraguaio rondou Udine. A equipe da cidade não venceu nenhum dos confrontos mais difíceis que teve até a 35ª rodada. Foi subjugado por Milan, Roma e Inter; empatou com o Napoli em casa. Ganhou apenas as partidas contra Lecce, Bologna e Parma. Assim, perdeu a terceira posição, que carregou durante a maior parte do campeonato.

Paralelamente, o time também viveu um momento complicado continentalmente, depois de se sair muito bem na fase de grupos, somando nove pontos e avançando aos mata-matas junto com o Atlético (que seria o campeão). A seguir, eliminou os gregos do PAOK, mas caiu para o AZ Alkmaar de forma bem apertada. Perdeu por 2 a 0 na Holanda e venceu por 2 a 1 na volta, caindo no gol sofrido em casa. 


Porém, a Udinese acordou a tempo de correr atrás do prejuízo. Comandada por Di Natale, que marcou três vezes nas quatro derradeiras rodadas, a equipe venceu todos os jogos que disputou. No confronto direto com a Lazio (que ficaria uma posição abaixo dos friulanos), fez 2 a 0. Com a defesa também em grande, deixou Cesena (1 a 0), Genoa e Catania (ambos 2 a 0) pelo caminho e, na última rodada, recuperou o terceiro lugar, classificando-se novamente à disputa do playoff da Liga dos Campeões.

Aquela não foi a temporada mais goleadora de Di Natale. Foram 23 tentos no Calcio, mas considerando todo o contexto de perda e superação, foi um ano importante. O clube assumiu o segundo melhor resultado de sua história, igualando o terceiro lugar de 1997/98 e sendo superado apenas pelo vice-campeonato de 1954/55. O capitão ficaria no time até o final de sua carreira, em 2015/16, mas a equipe acabou sucumbindo, lutando quase sempre contra o rebaixamento; não lembrando, nem de longe, os êxitos daquela temporada 2011/12.

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