Consciente: o mercado de inverno do Arsenal

Algumas transferências abalaram as estruturas do futebol europeu no último mês de janeiro. Namoros que se arrastaram por um tempo se tornaram casamentos, como foram os casos de Philippe Coutinho, que deixou o Liverpool e partiu para o Barcelona, e de Virgil van Dijk, que chegou aos Reds após se destacar no Southampton. E outras negociações que se desenharam foram confirmadas, como a saída de Lucas Moura, do PSG, ou a de Alexis Sánchez, do Arsenal. Neste caso, a perda para os Gunners é imensa, mas seria inevitável ao final da temporada, por vontade do atleta. Diante dessa realidade, o clube londrino fez o que pôde e acabou fazendo um mercado consciente e positivo.

Aubameyang Arsenal
Foto: Stuart MacFarlane/Arsenal FC/Getty Images


Certamente, o torcedor alvirrubro deve ter passado dias de grande apreensão durante a última janela de transferências, no inverno europeu. As duas maiores estrelas de sua equipe ficariam sem contrato ao final da temporada 2017/18 e não havia indicação de que fossem aceitar renovações. Além de Sánchez, Mesut Özil também se encontrava em vias de partir para uma nova aventura. Assim sendo, o clube poderia ter tido dois tipos de posturas, uma consciente e a outra ignorante. Vender os atletas por um preço modesto agora ou manter seus contratos até o final, aumentando sua insatisfação, e os perdendo a custo zero?

No caso do chileno, a direção dos Gunners foi astuta, nadou conforme a maré. Manchester United e seu rival local, o City, despontaram como os maiores candidatos à contratação da estrela sul-americana. Endinheirados e possuidores de atletas de alto nível, os mancunianos foram convidados a se embater pela contratação do atacante. Embora o preço final da negociação fosse ser muito inferior ao valor de mercado do jogador, por estar em final de contrato, o Arsenal procurou o melhor negócio possível.

Os vinte e poucos milhões de libras oferecidos pelos clubes não interessaram Arsène Wenger e companhia. A razão é bastante óbvia: em tempos de mercado inflacionado, os londrinos jamais conseguiriam contratar qualquer jogador com nível minimamente semelhante ao de Sánchez por essas cifras. Além disso, o mundo inteiro saberia que o clube precisaria de um reforço de alto nível e não é difícil imaginar que isso inflacionasse o valor das negociações com os Gunners. Então, o Manchester United colocou uma nova carta na mesa: Henrikh Mkhitaryan, em troca simples.

O armênio, contratado em 2016/17 junto ao Borussia Dortmund, não se adaptou nos Red Devils e não contava com a simpatia do treinador José Mourinho. Ainda assim, tratava-se de um jogador que dois anos antes havia construído 15 assistências e marcado 11 gols no Campeonato Alemão e, como se sabe, nem todo atleta se dá bem todo clube. Mkhitaryan está longe de ser um caso perdido e já mostrou no curso de sua carreira ter qualidades para ajudar o Arsenal – e, é claro, em negociação independente certamente custaria mais do que os valores oferecidos por Sánchez.

A princípio, conforme foi noticiado, o meio-campista se mostrou relutante a partir para o Emirates Stadium. Porém, Wenger bateu o pé: o chileno só deixaria Londres se, na contramão, o armênio chegasse. Passados alguns dias, o negócio foi firmado. Saiu Sánchez, entrou Mkhitaryan. O atacante tem uma carreira mais sólida do que o meia? Sim, claro. Entretanto, o Arsenal se encontrava em xeque e ganhou um respiro.

Aubameyang Mikhtaryan Borussia Dortmund
Foto: Getty Images
Porém, havia mais um assunto a ser tratado: Özil. Sem tantos interessados quanto seu ex-companheiro, o alemão trouxe uma questão diferente, uma vez que não renovava seu contrato mas também não trazia oportunidades ao clube. Então, os Gunners foram atrás de dinheiro para poder oferecer um salário mais vultuoso ao craque. Aos poucos, jogadores prescindíveis foram deixando o clube, aumentando a margem desse para oferecer vencimentos melhores ao alemão.

Finalmente, após mais de 12 anos, Theo Walcott deixou o clube, partindo para o Everton. É bom lembrar que na última renovação contratual do inglês com o clube, o Arsenal suou para conseguir sua assinatura, pagando-lhe uma bela bolada. Dispensável por muitos anos, mas suplente importante nos últimos tempos, o volante Francis Coquelin foi para o Valencia. Vale dizer, também, que essas duas negociações renderam mais de 30 milhões de libras aos cofres londrinos.

Com dinheiro no bolso e a necessidade de contratar outro jogador de alto nível, o Arsenal também se comprometeu a mostrar grandeza durante a janela. Definiu um alvo e não sossegou até ver seu desejo se concretizar. Insatisfeito no Borussia Dortmund, Pierre-Emerick Aubameyang se tornou o sonho de consumo do clube. A negociação se arrastou, mesmo porque os aurinegros não se desfariam de um astro, por mais problemático que tivesse se tornado, sem levar uma bela quantia para o Signal Iduna Park. O gabonês custou mais de 55 milhões de libras, a contratação mais cara da história do time e já chegou vestindo a histórica camisa 14, que pertenceu ao astro Thierry Henry. Todavia, mostrou que o clube não quer se apequenar.

A chegada do atacante teve, ainda, um viés muito interessante: foi tendo em Aubameyang uma referência que Mkhitaryan ganhou destaque. No Arsenal, gabonês e armênio vão se reencontrar. Se isso foi obra do acaso ou não, pouco importa, o fato é que ao menos em tese os Gunners têm a ganhar, pois agora contam com dois novos atletas que deverão ser titulares e já se conhecem.

Olivier Giroud Chelsea
Foto: Getty Images
Outro reflexo da chegada de Auba, que acabou diminuindo a margem de manobra por Özil, foi a crescente especulação a respeito da diminuição da utilização de Olivier Giroud, com o aumento da concorrência. O que se viu acabou sendo uma dança das cadeiras: o Arsenal trouxe o gabonês do Dortmund, vendeu Giroud ao Chelsea e este, por sua vez, emprestou Michy Batshuayi aos alemães. Wenger perdeu uma alternativa de ataque que vinha sem muito espaço, mas eliminou um potencial foco de insatisfação e voltou a ter maior orçamento salarial.


Assim, o Arsenal fez seu último movimento: renovou o contrato de Mesut Özil até 2021. O alemão ganhará mais que o dobro dos vencimentos de seu contrato anterior, sendo o mais bem pago do clube, e fica. O quadro que pintava a perda de dois jogadores de classe mundial acabou sendo pintado de outra forma: um saiu, deixando um bom substituto, o outro ficou. Uma nova estrela acabou chegando ao custo da saída de jogadores prescindíveis. Houve equilíbrio e o Arsenal deixou o mercado de transferências com o moral elevado. Deram limões ao clube que, à sua maneira, fez uma limonada.

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